Enquanto isso, na Casa Rosada: 'Puedes comprarlo, soy la garantía'
- Eduardo Papa
- 23 de fev.
- 3 min de leitura
De faraó a estelionatário: como Milei transformou seguidores em vítimas de um esquema financeiro e enfrenta o risco de impeachment

Vejam bem, caros leitores, a grande façanha do 'anarcocapitalismo' na Argentina - Javier Milei, o Ramsés dos Pampas, montou a maior pirâmide financeira da era moderna e subtraiu bilhões de incautos investidores em poucas horas. Lembro bem de meu avô dizendo: 'No asfalto não nasce nada, nem erva daninha. A única coisa que brota no asfalto é trouxa', e nossos vizinhos portenhos novamente corroboram a tese do velho Papa, caindo como patinhos em um dos golpes mais manjados da praça.
O presidente argentino usou a rede social de seu amigão Elon Musk para impulsionar um projeto com um token criado na blockchain da plataforma Solana chamado $LIBRA. Induziu seus seguidores a investirem na criptomoeda com a promessa de obter um gordo resultado financeiro e, ao mesmo tempo, ajudar empreendedores argentinos a conduzir a economia do país a um ciclo de prosperidade. Milhares de pessoas atenderam ao chamado do presidente, a $LIBRA chegou à cotação estratosférica de US$ 4.978, mas prosperidade mesmo somente para poucos investidores que ganharam em algumas horas centenas de milhões de dólares, realizando suas posições antes do ativo cair para alguns centavos, evaporando os recursos de milhares de investidores. Aí nosso faraó mandou uma egípcia, apagou o post, disse que não entende nada do assunto e que entrou de gaiato no navio.
Mas não é tão fácil assim, e parece que Milei não vai conseguir sair bem dessa. Foi comprovada a sua ligação com os beneficiados pelo golpe e inúmeras ações foram ajuizadas na Argentina por investidores lesados. A fraude financeira em dólar é crime nos EUA, e a justiça americana também vai atuar, a oposição já começou a coletar assinaturas para seu impeachment, enfim, uma tempestade perfeita chega ao Rio da Prata, ameaçando fazer naufragar, mais cedo do que se podia imaginar, o barco do queridinho da extrema direita mundial. O resultado final da patranha ainda não é possível prever, mas duas observações podemos fazer de imediato.
Em primeiro lugar, fica claro o poder de persuasão do discurso neoliberal impulsionado pelas redes sociais, junto à população dos países sob o domínio do imperialismo ianque. Uma influência tão poderosa capaz de fazer com que milhares de pessoas sejam levadas a investir sua poupança, por vezes recursos economizados em toda uma vida, em um negócio obscuro, contra qualquer recomendação de sensatez, seguindo cegamente as orientações de seu líder (ainda que saibam que essas podem ter sido psicografadas do além pelo cachorro morto, cujas dicas o presidente argentino diz seguir cegamente). Uma comprovação que a idiotia que observamos aqui nos nossos 'patriotários' não é uma jabuticaba, mas um padrão mental mundialmente observado entre os seguidores da extrema direita que viceja pelo mundo. Comprovando a hipótese do pensador italiano Vittorino Andreoli (1) de que o colapso civilizatório que vivemos marca o surgimento de uma nova espécie de homonídeo, o Homo stupidus stupidus, destinado a ocupar no mundo o lugar do Homo sapiens sapiens.
A segunda observação evidente é quanto ao DNA desses campeões da luta contra a corrupção e o sufocamento das pessoas pelo Estado malvadão. O desprezo total demonstrado pelos líderes fascistas pela sorte de seus seguidores diz tudo: quando Trump deporta com violência seus eleitores latinos. Quando Bolsonaro envia seus seguidores para pagar de bucha em sua tentativa de golpe, ou quando Milei tira sem piedade até os últimos tostões de seus apoiadores, fica claro como água que, assim como para Hitler, Mussolini, Franco, Bandera, Salazar e outros líderes fascistas do século XX, os próceres da chamada Altright destinam a seus apoiadores o único propósito de servir como massa de manobra para defender os interesses da plutocracia do mercado financeiro que os gerou e comanda.
(1) Andreoli, Vittorino. Homo stupidus stupidus: l’agonia di una civilitá. Roma – Rizzoli, 2018.

Eduardo Papa é colunista, professor, jornalista e artista plástico (www.mosaicosdeeduardopapa.com)
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