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Política é território: Léo Mattos de Xangô aponta caminhos para garantir direitos e dignidade às próximas gerações

  • Foto do escritor: Pimenta Rosa
    Pimenta Rosa
  • há 2 dias
  • 5 min de leitura

Em entrevista, destaca avanços como o Programa Casas Ancestrais e o INDEPIR, defende governança integrada e explica como sua trajetória influencia políticas voltadas a povos de matriz africana e população LGBTQIA+


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Num momento em que o debate sobre direitos, território e dignidade dos povos tradicionais ganha força no país, Léo Mattos de Xangô — gestor público, pesquisador e referência na articulação de políticas voltadas às populações de matriz africana — reforça a urgência de transformar demandas históricas em ações permanentes do Estado. À frente de iniciativas como o Programa Casas Ancestrais e a criação do INDEPIR, ele defende que orçamento, dados e institucionalidade são pilares indispensáveis para garantir proteção cultural, enfrentar a intolerância religiosa e assegurar que políticas de igualdade racial resistam às mudanças de governo.

Nesta entrevista ao Pimenta Rosa, Léo fala sobre desafios, resultados e caminhos possíveis para ampliar o alcance das políticas públicas, destaca o papel decisivo de parcerias entre universidades, cartórios, secretarias e sociedade civil, e aborda como sua própria trajetória — como homem gay, negro e iniciado em tradições afro-brasileiras — molda seu compromisso com comunidades LGBTQIA+, periféricas e de terreiros. Uma conversa direta, firme e profundamente alinhada ao futuro que queremos construir: um país onde memória, território e dignidade sejam garantidos às próximas gerações.



Como o senhor encara o desafio de transformar demandas dos povos tradicionais de matriz africana em políticas públicas permanentes, com orçamento, normativas e estrutura administrativa?

Com muita coragem e persistência. Não desisto enquanto não consigo publicar as normativas em Diário Oficial e, principalmente, garantir orçamento para as iniciativas propostas porque elas significam um grande passo para resolver os problemas das pessoas e dos territórios. Um dos aspectos principais é sempre operar em escala para aumentar os territórios e o número de pessoas atendidas.

 

 

Quais resultados do Programa Casas Ancestrais demonstram a importância do mapeamento de terreiros para regularização, proteção cultural e enfrentamento à intolerância religiosa?

O reconhecimento material das casas ancestrais com a concessão dos selos que foram colocados nos muros das comunidades é um ponto de destaque. Com o famoso "azulejo", as pessoas passaram a ser respaldadas pelo Estado e a publicação em Diário Oficial garantiu a oficialidade necessária para o combate a qualquer possibilidade de contestação ou preconceito. O reconhecimento, mesmo que seja ainda o primeiro passo para a obtenção do CNPJ e a regularização fundiária, é fundamental para a geração de dados confiáveis e concretos sobre as necessidades dos povos de matrizes africanas e seus territórios para que os gestores públicos possam atuar com mais assertividade.

 

 

De que forma indicadores como o INDEPIR fortalecem a capacidade do Estado de monitorar políticas de igualdade racial e orientar decisões governamentais?

São instrumentos de governança integrada, principalmente. Eles obrigam os gestores a se preocuparem com a geração de dados sobre as políticas que realizam desde o princípio. Isso faz com que as ações possam ser aperfeiçoadas e, em alguns casos, totalmente reorientadas. Além disso, promove a integração entre os órgãos e o intercâmbio de práticas, métodos e resultados. Quem ganha isso é a população que consegue ver resultados mais efetivos e duradouros. Sem dados, sem orçamento, sem memória, sem continuidade das políticas.

 


O senhor aponta a institucionalização como caminho central para a continuidade das ações. Que modelos de governança, conselhos e marcos legais considera indispensáveis para consolidar esses avanços?

A governança precisa ser integrada entre os órgãos públicos e transversal entre os temas. Os conselhos devem garantir a participação social com paridade em relação ao governo com orçamento para o desenvolvimento das suas ações que podem vir de fundos, por exemplo. Isso constitui o famoso "CPF" das políticas, sendo: conselho, plano de ações e fundo. Temos alguns exemplos bem-sucedidos como o SUS e as políticas de Cultura e Educação que se integram pelos três níveis de governo com divisão de responsabilidades.

 

 

Como as parcerias entre universidades, cartórios, secretarias e sociedade civil ampliam o alcance dos programas e garantem participação efetiva das comunidades envolvidas?

As parcerias aumentam a possibilidade dos gestores acertarem a elaboração, a implementação e o acompanhamento das políticas públicas porque envolvem atores de diversas especialidades que possuem vivências diferentes em seus territórios. O envolvimento dos órgãos de governo otimiza processos e acelera as respostas para a sociedade que deve ser parte do processo. No caso do INDEPIR, por exemplo, a Universidade Federal Fluminense foi contratada para aperfeiçoar os indicadores, fazer os cálculos e produzir o painel de dados digital para acompanhamento das políticas de igualdade racial nos órgãos da Prefeitura do Rio. Foi uma experiência bem-sucedida e que aumenta o controle social sobre as ações que são, inclusive, realizadas no âmbito da Rede de Cidades Antirracistas que criei em 2021, com o meu querido mestre, Jorge Freire.

 

 

Sua trajetória enquanto homem gay e iniciado em tradições afro-brasileiras influencia diretamente seu trabalho. De que modo essa vivência orienta políticas voltadas a populações LGBTQIA+ negras, periféricas e de terreiros?

Em primeiro lugar, a urgência de pensar em soluções para os problemas de grupos sociais que são, historicamente, minorizados e oprimidos. A reparação é necessária e para ontem! Em segundo lugar, a luta por equidade étnico-racial, de oportunidades, renda e direitos. Não é possível admitirmos, em 2025, que uma elite continue recebendo mais recursos e serviços do que aqueles que mais precisam. E em terceiro lugar e não menos importante, ocupar espaços de poder. Representatividade importa, acolhe os nossos e as nossas e abre portas para mais irmãos e irmãs chegarem. Eu preciso me ver representado no governo e quero que os meus também se reconheçam em mim. A política deve ser para nós também e lá, fazemos do nosso jeito.

 

 

Quais são hoje as prioridades mais urgentes para assegurar direitos, memória e dignidade às próximas gerações, especialmente no que diz respeito à saúde, educação, segurança alimentar, cultura e regularização fundiária?

As prioridades, didaticamente, se colocam no âmbito das políticas de desenvolvimento territorial. As cidades precisam ser pensadas de forma integrada e interseccional, isto é, articulando as necessidades dos grupos sociais diversos e priorizando aqueles que mais precisam. Na saúde, precisamos de acolhimento e de reconhecimento das práticas ancestrais. Na educação, uma disciplina de cultura afro-brasileira ajudaria bastante, já que as leis existentes (10.639/03 e 11.645/08) não são cumpridas adequadamente. Na segurança alimentar, a fome precisa ser erradicada com a agricultura familiar e tradicional. Na cultura, o fomento e a salvaguarda das tradições devem ser assegurados com capilaridade e menos burocracia. E daí voltamos à questão inicial: terra e território. O direito pleno sobre a terra é a base de todos os demais. O Quilombo Camorim foi titulado pela Prefeitura do Rio, em 2025, fruto de um processo aberto e instruído por mim, em 2024. Titular é preciso!

 
 
 

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