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A Palavra que Ecoa

  • Ronaldo Piber
  • 3 de abr.
  • 3 min de leitura

A urgência de acreditar nas vítimas de agressão, mesmo diante do Caso Daniel Alves



Por Ronaldo Piber*


A recente anulação da condenação de Daniel Alves por agressão sexual na Espanha reverberou com força na comunidade LGBTQIA+ e em toda a sociedade. Para nós, que historicamente lutamos por reconhecimento, respeito e segurança, a decisão reacende um debate doloroso e crucial: até que ponto a palavra de uma vítima é verdadeiramente valorizada, especialmente em casos de violência sexual?


O caso Daniel Alves, com suas reviravoltas e a alegação de inconsistências no depoimento da vítima como um dos pilares para a anulação, lança uma sombra sobre a já fragilizada confiança no sistema de justiça por parte de sobreviventes de violência sexual. Para a comunidade LGBTQIA+, essa desconfiança é muitas vezes amplificada por experiências prévias de discriminação, negligência e revitimização ao buscar apoio e justiça.


É fundamental reafirmar: a palavra da vítima tem um valor imensurável. Em casos de agressão sexual, que frequentemente ocorrem em contextos de intimidade e sem testemunhas, o relato da pessoa sobrevivente é, muitas vezes, a prova central. Desacreditar sistematicamente essa palavra é perpetuar um ciclo de impunidade que silencia vítimas e encoraja agressores.


A história da nossa comunidade é marcada por violências silenciadas, por abusos naturalizados e por uma cultura que historicamente culpabilizou as vítimas. Seja pela nossa orientação sexual, identidade de gênero ou expressão de gênero, corpos LGBTQIA+ são frequentemente hipersexualizados e vistos como alvos fáceis. A violência sexual contra membros da nossa comunidade é uma realidade cruel e persistente, e o medo de não serem acreditados é uma barreira significativa para a denúncia.


O caso Daniel Alves nos obriga a refletir sobre os critérios utilizados para validar ou invalidar o testemunho de uma vítima. É preciso questionar se as "inconsistências" apontadas não seriam, em muitos casos, as marcas do trauma, a dificuldade de reviver momentos de terror e a pressão de um sistema judicial que nem sempre está preparado para acolher e compreender a complexidade da violência sexual.


Não podemos permitir que a busca por uma "prova perfeita", muitas vezes inatingível nesses casos, se sobreponha à credibilidade da vítima. É crucial que o sistema de justiça adote uma perspectiva de gênero e entenda as dinâmicas da violência sexual, reconhecendo o impacto do trauma na memória e na narrativa da pessoa sobrevivente.


A anulação da condenação de Daniel Alves não pode ser interpretada como um sinal de que a palavra da vítima não importa. Pelo contrário, deve nos impulsionar a fortalecer ainda mais as redes de apoio às vítimas, a lutar por uma justiça mais sensível e a educar a sociedade sobre a importância de acreditar e acolher quem denuncia.


Enquanto comunidade LGBTQIA+, sabemos o peso do preconceito e da descrença. Nossa luta por direitos passa também por garantir que todas as vítimas de violência sexual, independentemente de sua identidade ou orientação, tenham suas vozes ouvidas e seus relatos levados a sério. Acreditamos na força da nossa união e na capacidade de construir um futuro onde a palavra da vítima seja o alicerce para a justiça e para a construção de uma sociedade mais segura e respeitosa para todas e todos.


Este caso nos lembra que a vigilância e a luta por justiça são constantes. Não nos calaremos diante da violência e continuaremos a ecoar a palavra de cada vítima, exigindo que seja ouvida, respeitada e valorizada. Porque a verdade de uma agressão reside, antes de tudo, na voz de quem a vivenciou.


*Ronaldo Piber

Advogado e colunista do Jornal Pimenta Rosa



 
 
 

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