“Boate das Fadas”: releitura queer e musical de Shakespeare ocupa o Sesc Copacabana
- Pimenta Rosa
- 2 de jul.
- 3 min de leitura
Com dramaturgia de Julia Limp e direção de Gustavo Damasceno, espetáculo ambienta “Sonho de uma Noite de Verão” numa boate LGBTQIAPN+ clandestina e discute desejo, identidade, erotismo e resistência com humor e poesia.

No palco da Sala Multiuso do Sesc Copacabana, um bueiro se abre para um submundo mágico e libertador. É por ele que o público desce, simbolicamente, à Boate das Fadas — uma reinvenção queer de Sonho de uma Noite de Verão, de William Shakespeare, onde o antigo bosque encantado dá lugar a uma boate clandestina LGBTQIAPN+ carioca. Criada por Julia Limp e dirigida por Gustavo Damasceno, a peça fica em cartaz até o dia 13 de julho, como parte do edital Sesc Pulsar 2024/2025.
A ideia da montagem surgiu da releitura crítica do clássico shakespeariano. “Sempre achei que Sonho de uma Noite de Verão tinha uma carga erótica fortíssima”, conta Julia ao Jornal Pimenta Rosa. “É uma peça sobre desejo, fantasia, confusão. O bosque do original já era um espaço permissivo. A boate é o nosso bosque contemporâneo — um lugar onde os corpos dissidentes podem existir sem julgamento”.
Na trama, dois casais homoafetivos desafiam as estruturas do poder patriarcal. Hérmia, filha de um pastor influente, está apaixonada por Lisandra, mas é ameaçada de morte caso não se case com Demétrio — jovem que, por sua vez, vive um conflito interno com sua própria sexualidade. Juntas, Hérmia e Lisandra fogem para a Boate das Fadas, onde planejam um novo começo.
Para Julia, a peça expõe com delicadeza a violência simbólica de estruturas normativas que ainda hoje ferem a juventude LGBTQIAPN+. “Muitas vezes, para viver sua sexualidade de forma livre, você precisa romper com sua família, com sua igreja. Isso é profundamente violento. Mas decidimos não focar na dor. Preferimos mostrar o que acontece quando o afeto floresce, quando se encontra um espaço seguro para existir.”
Essa escolha estética se reflete na atmosfera do espetáculo: um cabaré pulsante, com humor, erotismo, números musicais e figurinos exuberantes. A trilha sonora, dirigida por Rohl Martinez, transita entre o brega, o funk e o pop, com paródias e versões criadas em conjunto com o elenco. “A música ocupa um lugar dramatúrgico. Muitas vezes, substitui um monólogo, apresenta o personagem ao mundo”, explica a dramaturga.
A construção da boate fictícia — inspirada nos “inferninhos” cariocas, dark rooms e festas LGBTQIA+ do Rio — foi feita de maneira colaborativa, com improvisações em ensaio. “Cada artista trouxe sua vivência para criar essa atmosfera. O resultado é um espaço híbrido entre fantasia e realidade, entre símbolo e resistência”, comenta Julia.
O elenco é formado por Amarildo Moraes, Dai Ramos, Fernanda Chazan, Jeff Fagundes, Julia Limp, Marlon Vares e Michel Langer. A boate mágica é habitada por figuras mitológicas resignificadas: fadas dominatrixes, gogo boys e travestis que, com ironia e provocação, embaralham as fronteiras do desejo. “A Titânia é uma dominatrix, o Oberon transita entre dom e sub, o Puck é esse coringa do desejo que desafia as normas. É um convite a expandir o olhar para além da heteronormatividade”, reflete.
Além da camada artística, há também um forte componente de conquista política. Ocupando um palco institucional como o Sesc Copacabana, Boate das Fadas celebra o direito à existência e à expressão da diversidade:
“Conseguir montar esse espetáculo com estrutura e dignidade foi uma vitória. O Sesc nos deu segurança, acolhimento e nos conectou a um novo público. Em tempos de ataques à cultura e à comunidade LGBTQIAPN+, estar aqui é uma resposta — é resistência, é celebração”, afirma Julia.

Ficha Técnica:
Direção: Gustavo Damasceno
Dramaturgia: Julia Limp
Elenco: Amarildo Moraes, Dai Ramos, Fernanda Chazan, Jeff Fagundes, Julia Limp, Marlon Vares e Michel Langer
Participação: Rohl Martinez
Assistência de direção: Ayla Gabriela
Direção de produção: Gabriel Garcia
Direção musical: Rohl Martinez
Figurino: Bidi Bujnowski
Cenário: Carlos Anjos
Caracterização: Raibolt
Iluminação: Bruno Primo
Designer gráfico: Amarildo Moraes (Carambola Estúdio)
Assessoria de imprensa: Paula Catunda e Catharina Rocha
Social media: Manu Calmon (Calmon Lab)
Fotografia: Dalton Valério
Coordenação geral: Faminta Produções
Realização: Edital de Cultura Sesc RJ Pulsar
Apoio: Clássico de Copa e Cantina Donanna
SERVIÇO

Espetáculo: “Boate das Fadas”
Temporada: Até 13 de julho de 2025
Dias e horários: Quinta a domingo, às 19h
Local: Sala Multiuso do Sesc Copacabana
(Rua Domingos Ferreira, 160, Copacabana)
Ingressos: R$ 10 (associado do Sesc), R$ 15 (meia-entrada) e R$ 30 (inteira)
Informações: (21) 2547-0156
Horário de funcionamento da bilheteria: de terça a sexta, das 9h às 20h. Sábados, domingos e feriados, das 14h às 20h.
Instagram: @boatedasfadas





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