Bullying nas escolas e a urgência da proteção à juventude LGBTQIA+
- Ronaldo Piber
- há 1 dia
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*Ronaldo Piber
Como advogado e colunista do Jornal Pimenta Rosa, trago nesta semana uma reflexão necessária: o bullying contra estudantes LGBTQIA+ continua sendo uma das formas mais graves de violência nas escolas brasileiras. Pesquisas recentes, como a Pesquisa Nacional sobre o Bullying no Ambiente Educacional Brasileiro 2024, divulgada em abril de 2025 pela UNESCO no Brasil, em parceria com o Ministério da Educação (MEC) e o Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania (MDHC), apontam que 90% desses jovens já sofreram agressões verbais no ambiente escolar, e 86% relatam não se sentirem seguros. Esses números refletem uma cultura de preconceito e intolerância que, lamentavelmente, ainda persiste em muitos espaços educativos.
O bullying não pode ser tratado como uma brincadeira sem consequências. Ele é uma afronta direta aos direitos fundamentais, afetando a saúde emocional, o aprendizado e o futuro de toda uma geração. As marcas deixadas por essas agressões vão muito além da infância e adolescência, impactando a autoestima, a saúde mental e as oportunidades de vida dos jovens LGBTQIA+. O isolamento social, o desenvolvimento de transtornos de ansiedade, depressão e o aumento do risco de suicídio são apenas algumas das consequências que exigem a nossa atenção urgente.
Dados de organizações como o Grupo Gay da Bahia e a Antra (Associação Nacional de Travestis e Transexuais) revelam que a evasão escolar entre jovens LGBTQIA+ é significativamente maior do que entre seus pares heterossexuais e cisgêneros. Cerca de 36% dos jovens gays e lésbicas abandonam a escola devido a episódios contínuos de bullying e discriminação, enquanto entre jovens trans esse número pode ultrapassar 70%. O risco de suicídio também é alarmante: estudos indicam que jovens LGBTQIA+ têm de quatro a cinco vezes mais chances de tentar suicídio em comparação com jovens heterossexuais. Para jovens trans, o índice de tentativa de suicídio pode chegar a 50%.
É imprescindível que instituições de ensino adotem políticas firmes e eficazes de combate à violência, promovendo o respeito à diversidade e à dignidade humana. Essas ações devem incluir programas educacionais que abordem a temática LGBTQIA+ de maneira natural e respeitosa, desconstruindo preconceitos desde as séries iniciais. Capacitar educadores, oferecer suporte psicológico, criar canais de denúncia efetivos e estimular uma cultura de acolhimento e empatia são passos fundamentais para transformar o ambiente escolar.
Essa transformação, no entanto, exige também o envolvimento de toda a sociedade: famílias, gestores públicos, professores e colegas. A construção de um ambiente escolar seguro e inclusivo é uma responsabilidade coletiva, que começa no reconhecimento da diversidade como um valor e não como um motivo de exclusão. O silêncio diante do bullying é, também, uma forma de conivência que perpetua a violência.
Além disso, é importante que as vítimas saibam que possuem instrumentos jurídicos para sua proteção. O bullying pode ser enquadrado em diversas infrações previstas no Código Penal, como injúria, difamação, ameaça e constrangimento ilegal. A responsabilidade civil da escola também é reconhecida, podendo ser acionada por omissão na proteção dos estudantes.
As vítimas ou seus responsáveis podem registrar boletins de ocorrência, procurar conselhos tutelares, Ministério Público e Defensorias Públicas para solicitar providências. Em casos graves, medidas protetivas podem ser requeridas judicialmente para preservar a integridade física e emocional da vítima. Ainda, é possível ingressar com ações judiciais visando à reparação dos danos morais sofridos. O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) garante proteção integral aos estudantes, assegurando seus direitos à dignidade, ao respeito e à liberdade, devendo ser uma referência para toda atuação nesse contexto.
É fundamental também destacar que denunciar o bullying é um ato de coragem e resistência. A denúncia não apenas protege a vítima imediata, mas contribui para romper o ciclo de violência e construir um futuro em que a escola seja um espaço seguro para todos.
Proteger nossos jovens é garantir que cada estudante LGBTQIA+ possa viver sua identidade plenamente, sem medo e sem violência. É nosso dever, enquanto sociedade, assegurar que os direitos à educação, ao respeito e à dignidade sejam não apenas reconhecidos, mas efetivamente respeitados em cada sala de aula do país. A luta contra o bullying é, acima de tudo, uma luta por direitos humanos e pela construção de uma sociedade verdadeiramente democrática e inclusiva.
*Ronaldo Piber é advogado e colunista do Jornal Pimenta Rosa
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