PERDEU MANÉ, NÃO AMOLA
- Eduardo Papa*

- 10 de ago.
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*Eduardo Papa
Em novembro de 2022, o Ministro Roberto Barroso estava em Nova Iorque, quando foi abordado por um desses Bolsonaristas chatos, que ficam aporrinhando os outros nos lugares mais impróprios. Nessa quarta-feira mesmo, no Galeão, o Romário teve que aturar um cricri desses (parece que os fascistas dão plantão em aeroporto), lembram do infeliz que foi perturbar o Ministro Zanin no banheiro do aeroporto? Ora se nem nesse lugar reservado a paz é garantida, imaginem na via pública. O sujeito vinha atrás do Barroso fazendo umas perguntinhas sobre o código fonte das urnas eletrônicas, o que na época fazia furor entre os patriotários, gravando tudo para garantir seu brilhareco entre a turminha. A insistência desagradável do assediador ensejou ao ministro a oportunidade de proclamar sua sentença mais retumbante, vira-se para o gajo e lasca: “Perdeu Mané, não amola”.
Hoje, após a traição urdida por Eduardo Bolsonaro e o seu cambono neto de ditador na corte imperial de Trump; das desafinadas de Malafaia nas micaretas dos fascistas, cada vez mais esvaziadas; e da ópera bufa encenada pela patética bancada fiel ao mito, agindo como crianças mimadas, impedindo o Congresso de funcionar, com um comportamento ridículo, digno de comédia pastelão (o pusilânime Hugo Motta diz que vai ter punição, a conferir). Passou da hora de todos nós brasileiros, cansados de anos dessa palhaçada, dizermos a essas pessoas algo capaz de produzir um choque de realidade em suas pobres mentes atordoadas – PERDEU MANÉ, NÃO AMOLA. Em fina ironia do destino, foi um ministro do STF, acostumado ao uso do português castiço, que nos ofereceu a expressão coloquial perfeita para contrapor ao incômodo de ouvir esses discursinhos cômicos e repetitivos dos adoradores de pneus.
As pessoas equilibradas emocionalmente e com um mínimo de capacidade cognitiva estão fartas de assistir esse espetáculo lamentável, protagonizado por essa gente iracunda que confunde a liberdade de expressão com liberdade para mentir e ofender, que tem a mente intoxicada pelo ódio a tudo o que não for espelho de suas concepções rasas e edificadas sobre preconceitos. Ninguém aguenta mais essas pessoas mal-educadas e de maus bofes, cuja profunda ignorância levou a assimilar os pensamentos de um guru que fugiu da escola no primário, e os ensinou a contrapor argumentos ponderados com grosserias e agressões. E não bastasse sermos obrigados a aturar essa mediocridade no dia a dia, de vez que convivemos com pessoas com a mente capturada pela infernal máquina de desinformação das redes sociais, ainda carregamos o fardo adicional de ver nosso poder legislativo achincalhado pela atuação da súcia de ordinários, guindados às culminâncias do poder por essa malta ignóbil.
É bem verdade que nossa representação política sempre teve espaço para a bizarrice de pessoas despreparadas, os Tiriricas da vida sempre tiveram presença garantida em nossa vida política, porém, tinham o seu lugarzinho no baixo clero, e não se faziam notar no funcionamento de nossas casas legislativas. O próprio Bolsonaro teve uma longa e improdutiva carreira como deputado federal, não contribuía com nada, mas também não atrapalhava, servindo apenas como piada. Agora não! Os patriotários e afins capricharam na lambança. Em sua cruzada contra a corrupção elegeram um monte de ladrões, só em Santa Catarina são mais de 30 prefeitos bolsonaristas afastados por malversação de recursos públicos. A atual composição do Congresso Nacional é uma desgraça, e não foi só o sul do país que brindou a nação com sua bancada de extremíssima direita. Do Centro Oeste veio um deputado que matou e alejou pessoas dirigindo embriagado e um rotundo careca que vivia distribuindo ofensa e agressões no plenário da Câmara, e elegeu-se prefeito de uma capital importante na região. De São Paulo veio outro que matou a namorada com um tiro “acidental”, além de elegerem o governador carioca do MAGA, bem como seu parceiro traidor da pátria Eduardo Bolsonaro. O Senado não fica atrás, lá está uma pastora que diz ter visto Jesus trepando em um pé de goiaba, quem sabe sob o efeito de alguma droga daquelas que os aviões de sua Igreja transportavam. O brilhante Fabiano Contarato é obrigado a dividir a bancada do Espírito Santo com o pinguço Magno Malta, que costuma se apresentar no serviço trôpego e embaralhando as palavras, e o doidivanas Marcos do Val, que defende a invasão do Brasil pelos EUA, país do qual se orgulha de ser informante. Enfim, descrever o mal que emergiu com o bolsonarismo não caberia em dez ou vinte artigos desse tamanho, vamos então direto ao antídoto para o veneno.
Para sair do antro estreito, em que muitos incautos entraram, recomendo o binômio reflexão e ação. Não sou aspirante a coach, ou qualquer coisa do gênero, vai longe de mim a pretensão de influenciar as pessoas ou mostrar caminhos a serem seguidos, mas com base em minha própria experiência, creio que posso trazer para o leitor uma contribuição para se livrar da lavagem cerebral que nos é imposta. O primeiro passo é a reflexão de qualidade sobre tudo o que é importante para nós. Chamo de reflexão de qualidade, o pensamento encadeado que leva a conclusões lógicas, embasado na ciência e orientado por uma ética de respeito ao outro. A leitura profunda é essencial para o posicionamento e a tomada de decisões adequadas e frutíferas, desenvolve o universo mental, amplia o vocabulário e a capacidade de expressão, só ela pode nos livrar das armadilhas que o “senso comum” espalha em nossos caminhos. A força do conhecimento é imensa, trata-se de um bem de inestimável valor, que carregamos dentro de nós e, portanto, não pode de nós ser subtraído, além do que pode crescer de maneira continuada. Uma maravilha!
Olhe para o mundo em que vivemos, China, Japão, Vietnã e Coréia prosperam por quê? Os regimes políticos são diferentes, seus processos históricos são conflituosos, qual o elemento comum que os conduz ao sucesso? A educação de seu povo é a resposta. Tanto no conservador Japão Imperial, quanto na China comunista, lideranças como Trump e Bolsonaro jamais se criariam. Sociedades compostas por cidadãos educados, não são presa fácil para o império das Big Techs e a imposição dos padrões de comportamento que trazem. Não tenho contas ativas em redes sociais, não acho que isso seja fundamental, nem desfaço da minha telinha azul, para a qual estou olhando agora, mas tô fora! Minha comunicação passa longe de bate-boca em tempo real, sujeito a comportamento intempestivo e açodado. Assumo minhas posições após estudar os temas sob vários aspectos. Não opino sobre o que não conheço bem, respeito todas as posições até saber suas diversas implicações e, sobretudo, estudo com a profundidade que consigo atingir aquilo que a mim importa.
Infelizmente nossos resultados na educação são decepcionantes, os níveis de proficiência na instrução formal, o número de leitores, a produção acadêmica, tudo deixa a desejar, mas há uma massa crítica no Brasil, sobretudo nas grandes capitais, entretanto parte dessas pessoas parece não ser mais capaz de transformar sua reflexão em ação política. Décadas de neoliberalismo furioso, destruíram a credibilidade de sindicatos e os trabalhadores foram atomizados em um regime de trabalho cada vez mais dominado por aplicativos; associações de moradores das periferias ou foram dominadas pelo crime, ou estigmatizadas como se o fossem; entidades da sociedade civil e corporativas como a OAB, ABI, IAB foram esvaziadas. O mínimo espaço de resistência à barbárie que restou, a universidade pública, vive sob ataque cerrado do fascismo. Por onde agir então, se os caminhos conhecidos estão obliterados?
É muito recorrente a opinião de que o combate nas redes sociais é caminho das pedras, que disputar as redes e suplantar o discurso da extrema direita nelas pela racionalidade é possível. Muita gente boa se empenhou nisso, o que resultou em uma excelente rede de informação alternativa que dispomos na internet, não quero nem citar exemplos porque são muitos, e muito bons! Incluindo o nosso glorioso Pimenta Rosa. Não é isso o que nos falta, essa rede de comunicação e produção de conteúdo é vital, mas não garante a vitória. Nosso valoroso pessoal está lutando no campo escolhido pelo inimigo, que faz as regras, tem todas as vantagens e pode trapacear quando precisar. A chave para limpar a nossa política dessa escória não está no teclado de um computador, mas no da urna eletrônica.
O fascismo sabe muito bem que a influência nas redes só se materializa em poder econômico e político através da institucionalidade. Por que as Igrejas Neopentecostais investem tanto para controlar os Conselhos Tutelares? Por que a burguesia, que já tem o poder econômico, agarra-se de unhas e dentes ao poder político? Porque é dentro do Estado que o poder se consubstancia, toma forma e é exercido. A ânsia pela destruição do Estado dos próceres do neoliberalismo é porque sabem que ele é o lócus apropriado para o crescimento do poder das pessoas comuns. Banqueiros, latifundiários e grandes capitalistas não precisam do Estado, usam-no para garantir e legitimar sua dominação econômica sobre o resto do povo, mas para quem não é herdeiro, para 99% dos brasileiros o Estado é essencial. O que seria de nós sem o SUS? O que seria de nossas crianças sem a escola pública? Como seria a vidas nas comunidades pobres do Brasil sem o Bolsa Família? O cínico arauto do Eldorado neoliberal costuma apontar como solução o empreendedorismo, em outras palavras dizendo ao povo “que se vire nos trinta”, e ainda há quem acredite nessa impostura.

Todos nós assistimos o episódio deplorável dos fascistas do esparadrapo parando o Congresso na marra, quem acompanha mais amiúde o funcionamento do legislativo, pode atestar a bestialidade e o nível rasteiro dessa gente, que se desnudou no evento para todo o Brasil. Se a nação aceitar que essa chusma continue com a representação que tem no poder, o golpe de estado que os generais queriam dar com Bolsonaro virá com certeza. No Brasil, historicamente, nas eleições para o poder executivo, candidatos progressistas tem mais facilidade de derrotar o campo conservador, já nas eleições para o legislativo a reação deita e rola. No varejo das eleições proporcionais o dinheiro pesa muito e o apoio do grande capital garante, com tranqüilidade, a eleição da maioria dos representantes do povo, que legislam em favor da pequena parcela da população que os financiou, uma realidade evidente.
Então aí vai a receita, destinada principalmente aos mais jovens, pois as pessoas de cabelos brancos que andam por aí, defendendo ditadura para ter liberdade de expressão, indignadas com as mamadeiras de piroca, ou apoiando Israel porque acham que é um país cristão, são caso perdido, provavelmente irão fazer papel de bobo até segurar na mão de Deus. Mas perder o debate entre os jovens não é mais aceitável. Um rio de dólares foi canalizado para criar organizações e movimentos sociais para cooptar os jovens para a visão neoliberal do mundo, foram competentes e conseguiram um sucesso impressionante. Porém, jovens, além de suscetíveis a mudanças de visão mais facilmente, sempre estão chegando mais e mais a cada ano (embora a taxa de crescimento vegetativo seja declinante). E o fascismo encontrou na sociedade brasileira um osso duro de roer - a universidade pública e os nossos professores, não é à toa que estão sob ataque cerrado da extrema direita.
Então jovens do Brasil, estudem! Estudem muito! Façam curso superior, mestrados, doutoramentos. Desenvolvam sua mente observando, sob o prisma da ciência, o mundo que nos cerca, ampliem seu potencial intelectual, não apenas nas áreas específicas de seu interesse profissional, mas também procurem analisar com a máxima profundidade as instituições e a engenharia social que regem a nossa sociedade. Claro que sempre haverá aquele que ao terminar a escalada social, chute a escada, para impedir a ascensão de outros, faz parte, pois o capital compra mentes e aluga atitudes, mas não pode e nem quer comprar a todos. É da quantidade que sai a qualidade, e hoje o acesso necessário para uma formação decente é mais disponível do que nunca. A internet abriu um universo para pessoas com desejo de ampliar seus horizontes, mas com dificuldades de acessar o ensino presencial. A pobreza e a distância agora podem ser dribladas mais facilmente, quem procurar vai achar os meios necessários, dou como exemplo (sem ganhar nada pela recomendação) o Instituto Conhecimento Liberta do Eduardo Moreira, que faz um trabalho excelente, contrapondo ciência e ética ao charlatanismo intelectual, fortemente impulsionado, de plataformas de extrema direita que espalham fakenews, com uma falsa capa de seriedade. Precisamos de milhões de jovens bem-preparados tecnicamente e identificados com os interesses populares, para passar nos concursos públicos e povoar o nosso Estado com gente do bem, capaz de espanar essa corja que costuma autodenominar-se cidadãos de bem.
Outro passo importante para o progresso institucional é a participação mais decidida no processo eleitoral, Não dá mais para deixar entregue a milicianos e corruptos conhecidos o nosso poder legislativo, tem que entrar sangue novo em nossas casas legislativas, não estou dizendo que é fácil furar o bloqueio para entrar no clubinho, eu já fui candidato e sei como a banda toca, mas tem que tentar. É natural que as pessoas de bons instintos e propósitos elevados evitem a participação na vida política. Afinal, a simples visão de seu provável ambiente de trabalho no futuro desencoraja os bons corações, mas sem oferecer melhores opções (e mais viáveis), nada mudará, e vamos continuar a ver nossas casas legislativas ocupadas por esses delegados, generais e milicianos em geral. Vários segmentos importantes do nosso tecido social não estão representados no parlamento. É um absurdo que não haja uma representação oriunda dos entregadores de aplicativo em nossas casas legislativas, por exemplo.
E o momento é propício! O gado está amuado. Como muito bem observou o professor João Cezar de Castro Rocha que, com perfeita paciência, tem observado os atos públicos dos bolsonaristas em Copacabana, o clima é de fim de festa. No subconsciente, os “manes” já sabem que perderam, vão para as eleições ano que vem como a torcida de time que caiu para a segunda divisão, com seu mito na cadeia, e sem anistia. Muitos dos atuais deputados vão estar nas cordas, tendo que dar explicações sobre assuntos espinhosos do orçamento secreto ao Ministro Flávio Dino. Ficaram sem candidato a presidente, no máximo tem um candidato a ser um Juan Guaidó da vida, radicado nos EUA e agarrado no saco de Trump, que por sua vez caminha a passos largos para perder as eleições legislativas, no final do ano que vem. É hora de partir para cima e dar o troco que eles merecem, por todas as pessoas que morreram sem precisar na pandemia, por todos os brasileiros que foram obrigados a revirar o lixo para comer, pelos Yanomami massacrados pelos garimpeiros de Bolsonaro et caterva, vamos deixar bem claro para essa gente horrorosa que perderam, e que bem que poderiam fazer a gentileza de parar de amolar.
*Eduardo Papa - Colunista, professor, jornalista e artista plástico (www.mosaicosdeeduardopapa.com)





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